sábado, junho 30, 2007
Foi a docilidade do teu olhar que fez desaparecer as pontas do vidro preso por detrás dos nomes e rasgou o lacre entre a existência e a essência de cada palavra.
Sou o nome que me dás, na iniciação da transcendência do que sou.
Sou o nome que me dás, na iniciação da transcendência do que sou.
sexta-feira, junho 29, 2007
Não. Não sinto absolutamente nada ao saber que o Amândio e o Gonçalo vão ao SBSR. Nada. Afinal, Jesus and Mary Chain, Interpol, Arcade Fire e outros não são assim tão fixes (até fico surpresa por lembrar-me do nome destas bandas). Nem eu queria estar lá para ver isso.
Em outras palavras, tasse bem. Nem ligo.
Em outras palavras, tasse bem. Nem ligo.
sexta-feira, junho 22, 2007
Ponta de lua
segura
por um fio de destino
a distância da pele
até um espaço
solto de céu.
segura
por um fio de destino
a distância da pele
até um espaço
solto de céu.
Isso não é o produto final.
Gravidade. Presença. Linha na vida das ruas, minha sombra contra a calçada.
Uma frase que não está por dentro de mim, escuto.
Calo.
Isso não é o produto final.
Um ponto de exclamação espera-me na convergência dos ângulos.
Descolo as tuas forças para o centro do mundo, mas não sei onde estás.
O abandono, sinto-o agora, junto a mim, deixo-te levar estilhaços.
Sacrifica isso a quem te apetecer, não sei os nomes dos deuses.
Gravidade. Presença. Linha na vida das ruas, minha sombra contra a calçada.
Uma frase que não está por dentro de mim, escuto.
Calo.
Isso não é o produto final.
Um ponto de exclamação espera-me na convergência dos ângulos.
Descolo as tuas forças para o centro do mundo, mas não sei onde estás.
O abandono, sinto-o agora, junto a mim, deixo-te levar estilhaços.
Sacrifica isso a quem te apetecer, não sei os nomes dos deuses.
sexta-feira, junho 15, 2007
Perdia-me sempre no túnel ao ler as inscrições impressas nas lascas soltas que forravam o abismo no centro da terra. Cada frase que lá encontrava acendia um fogo azul que nunca mais permitiria que eu dormisse ou sonhasse, pois aquele caminho da memória tocava-me no reduto das presenças perdidas para o nada dentro de mim, que eu agora invocava.
quarta-feira, junho 13, 2007
Pela janela estendem-se as palhas esfumadas de céu, onde se pressente um amarelo frio de tarde húmida. Do alto das pedras velhas de um muro em pó agitam-se flores que, em breve, deitar-se-ão num veludo rebelde em farrapos.
Não tenho nada debaixo dos pés, nem além da rapidez do vidro da janela, e nesta calma o dia entra em lua crescente.
Não tenho nada debaixo dos pés, nem além da rapidez do vidro da janela, e nesta calma o dia entra em lua crescente.
terça-feira, junho 12, 2007
Amândio, welcome aboard :)
the assassination of Jesse James (excerto)
Peço a todos que atentem no potencial cinematográfico deste pequeno excerto daquele que é já, para mim, o melhor livro da segunda metade do século XX, retratando a vida do maior americano de sempre("os americanos escolhem quase sempre os seus heróis entre a classe criminal" - Oscar Wilde)
Dick Liddil selou a sua égua baia às sete horas da noite seguinte e cavalgou lentamente para sul, tão mal de estômago que decidiu experimentar uma das prescrições de Jesse, engolindo tártaro com sal e goma-arábica empoada. Ao cruzar os terrenos dos Hite, deixou-se tomar pelo pânico; fez a sua égua rodar sobre si própria mais do que uma vez, vigiando, amedrontado, os bosques envolvidos pelas trevas, saltando da sela a cada crepitar das folhas de Outono, apontando a sua Navy Colt aos guaxinins que brincavam no rio. As árvores gemiam e suspiravam ao sabor do vento que as beijava; as plantas moviam-se, sussurrando com o cuidado dos que choram os defuntos à luz trémula das velas; e Dick inventava fantasmas, assustado como um homem sozinho no seu quarto que vê o puxador do armário a mover-se e a porta a abrir-se com toda a lentidão.
Atravessou um prado e seguiu montado na sua égua até às margens do afluente, onde ela chapinhou na água, que mal lhe dava pelas coroas dos cascos. O aido era uma espécie degenerada de celeiro; as gamelas dos porcos eram cobertas por um telhado e o resto não passava de um lamaçal cercado por uma vedação de tabuinhas muito mal construída. Dick fez ranger a sua sela, leu o mostrador do seu relógio de bolso com a ajuda de um fósforo e olhou em volta à procura de Sarah.
Desceu da égua e deixou-a procurar algumas folhas para comer, enquanto ele caminhava na direcção do cume do monte.
Os porcos grunhiam, roncavam e saltavam uns para cima dos outros, tentando chegar primeiro à comida. As ervas curvavam-se com a ventania e todos os receios se reagrupavam para voltar a atormentá-lo. Os porcos continuavam a fazer barulho, todos amontoados, até que se ouviu um som como o de páginas a serem arrancadas de um livro e os porcos puseram-se a guinchar em volta de uma fêmea que devorava, egoísta, qualquer coisa imperceptível, afastando-se calmamente do canto. Dick inclinou-se sobre a vedação da pocilga, que nem um campónio ignorante, e perguntou, “Mas que raio estão estas bestas a comer?”
Então, Dick viu um pé e um tornozelo a dançar, enquanto os porcos brigavam e chafurdavam em cima de um casaco de lã coberto de lama. Um calafrio monumental varreu todo o seu corpo, sentiu picadas na pele e a sua visão ficou turva com a água, enquanto fustigava os porcos nos jarretes com o chapéu. Estes fugiram à toa, chiando e resfolegando, mas sempre com os focinhos colados à terra. Ficou só uma porca, puxando por um tendão e, consequentemente, arrastando todo o corpo, mas Dick enterrou um balázio na lama e a porca debandou, assustada, para junto dos outros.
O casaco de lã estava todo enroscado, num dos lados, e um dos braços estava torcido por debaixo das costas do homem, enquanto o outro estava apoiado na tábua inferior da vedação. Dick conseguia ver que a pele nos nós dos dedos era castanha, mas essa era a única pista de que se tratava de John Tabor, já que quase toda a sua garganta e a cara tinham sido comidas, restando apenas o vermelho vivo dos tendões, ripas de músculos e cartilagens, além dos ossos do crânio, polidos pelo sangue.
Dick Liddil selou a sua égua baia às sete horas da noite seguinte e cavalgou lentamente para sul, tão mal de estômago que decidiu experimentar uma das prescrições de Jesse, engolindo tártaro com sal e goma-arábica empoada. Ao cruzar os terrenos dos Hite, deixou-se tomar pelo pânico; fez a sua égua rodar sobre si própria mais do que uma vez, vigiando, amedrontado, os bosques envolvidos pelas trevas, saltando da sela a cada crepitar das folhas de Outono, apontando a sua Navy Colt aos guaxinins que brincavam no rio. As árvores gemiam e suspiravam ao sabor do vento que as beijava; as plantas moviam-se, sussurrando com o cuidado dos que choram os defuntos à luz trémula das velas; e Dick inventava fantasmas, assustado como um homem sozinho no seu quarto que vê o puxador do armário a mover-se e a porta a abrir-se com toda a lentidão.
Atravessou um prado e seguiu montado na sua égua até às margens do afluente, onde ela chapinhou na água, que mal lhe dava pelas coroas dos cascos. O aido era uma espécie degenerada de celeiro; as gamelas dos porcos eram cobertas por um telhado e o resto não passava de um lamaçal cercado por uma vedação de tabuinhas muito mal construída. Dick fez ranger a sua sela, leu o mostrador do seu relógio de bolso com a ajuda de um fósforo e olhou em volta à procura de Sarah.
Desceu da égua e deixou-a procurar algumas folhas para comer, enquanto ele caminhava na direcção do cume do monte.
Os porcos grunhiam, roncavam e saltavam uns para cima dos outros, tentando chegar primeiro à comida. As ervas curvavam-se com a ventania e todos os receios se reagrupavam para voltar a atormentá-lo. Os porcos continuavam a fazer barulho, todos amontoados, até que se ouviu um som como o de páginas a serem arrancadas de um livro e os porcos puseram-se a guinchar em volta de uma fêmea que devorava, egoísta, qualquer coisa imperceptível, afastando-se calmamente do canto. Dick inclinou-se sobre a vedação da pocilga, que nem um campónio ignorante, e perguntou, “Mas que raio estão estas bestas a comer?”
Então, Dick viu um pé e um tornozelo a dançar, enquanto os porcos brigavam e chafurdavam em cima de um casaco de lã coberto de lama. Um calafrio monumental varreu todo o seu corpo, sentiu picadas na pele e a sua visão ficou turva com a água, enquanto fustigava os porcos nos jarretes com o chapéu. Estes fugiram à toa, chiando e resfolegando, mas sempre com os focinhos colados à terra. Ficou só uma porca, puxando por um tendão e, consequentemente, arrastando todo o corpo, mas Dick enterrou um balázio na lama e a porca debandou, assustada, para junto dos outros.
O casaco de lã estava todo enroscado, num dos lados, e um dos braços estava torcido por debaixo das costas do homem, enquanto o outro estava apoiado na tábua inferior da vedação. Dick conseguia ver que a pele nos nós dos dedos era castanha, mas essa era a única pista de que se tratava de John Tabor, já que quase toda a sua garganta e a cara tinham sido comidas, restando apenas o vermelho vivo dos tendões, ripas de músculos e cartilagens, além dos ossos do crânio, polidos pelo sangue.
segunda-feira, junho 11, 2007
Destaco os mistérios das teias e ouço o infinito em cada eco do mundo. Só não sei onde posso guardar tudo isso.
sábado, junho 09, 2007
A existência e a matéria são sistemas fascistas fielmente representados pela ciência de contornos mais proibitivos já alguma vez elaborada, a matemática. Para provar o que digo, basta um simples olhar crítico na assim chamada “verdade” que nos proíbe de dividir qualquer coisa por zero. Como em qualquer boa ditadura, tipicamente nos dizem que é assim porque é assim, que somos burros se não entendemos isso e que não vão perder tempo a discutir isso connosco; adicionam a este discurso um grito histérico e ainda somos frequentemente levados ao blue screen of death se algum programador ousou profanar os Céus e cometer tal heresia, não vá tal doutrina libertária conquistar adeptos dentre os utilizadores de pcs.
Na verdade, a impossibilidade da divisão por zero assenta-se nos mesmos princípios capitalistas que geram a estratificação social, a pobreza e a injustiça, pois assume que algo que exista só pode ser dividido por algo que também exista, transportando assim a mecânica de poder material para os números e recriando todos os impérios económicos em cada operação aritmética.
E se realmente esta impossibilidade é espelho de alguma vontade universal, então este mesmo axioma prova que Deus não existe, pois em qualquer universo digno de alguma metafísica não seria proibida a dissolução de algo dentro de si mesmo, num grandioso processo de divisão por zero.
Na verdade, a impossibilidade da divisão por zero assenta-se nos mesmos princípios capitalistas que geram a estratificação social, a pobreza e a injustiça, pois assume que algo que exista só pode ser dividido por algo que também exista, transportando assim a mecânica de poder material para os números e recriando todos os impérios económicos em cada operação aritmética.
E se realmente esta impossibilidade é espelho de alguma vontade universal, então este mesmo axioma prova que Deus não existe, pois em qualquer universo digno de alguma metafísica não seria proibida a dissolução de algo dentro de si mesmo, num grandioso processo de divisão por zero.
sexta-feira, junho 08, 2007
Pressiono aos fogos
estrofes geradas em pele despida.
Em água torcida,
escava-me hiatos
na caixa fechada
por trás da memória.
estrofes geradas em pele despida.
Em água torcida,
escava-me hiatos
na caixa fechada
por trás da memória.
quarta-feira, junho 06, 2007
Olho para o sol aberto no céu, os raios em ponta adormecem-me nos dedos. Olho alto, olho azul, sob o ponto mais alto do mundo em solstício, para o silêncio no espelho ao longo da estrada. Digo que não, mas espero-te nos passeios sem rumo, ao fim do segundo que segura o céu.